Dr. Guaraci de Campos Vianna
Não se precisa dizer que o sistema prisional brasileiro está em crise. Violência, falta de vagas, prisões calabouços, superlotação, falta de higiene e saúde, etc. Recentemente o STF reconheceu que o sistema penitenciário brasileiro, em estado de coisas, é inconstitucional. Isso quer dizer que as penas privativas de liberdade podem ser consideradas cruéis e desumanas em razão das atuais precárias condições.
Verdade é que não há prioridade em resolver ou minimizar o quadro caótico em que vivem os presos. Não se está fazendo aqui apologia aos detentos e nem demagogia aos direitos humanos. O preso criminoso deve pagar pelos seus atos e a sociedade deve isolá-los até que demonstrem que não vão reiterar a prática criminosa. Mas os critérios para progressão de regime, livramento condicional, saídas temporárias e outras benesses, infelizmente tem outras motivações políticas, inclusive de ordem econômica, diferentes daqueles voltados à não delinquência.
Entretanto, é bom que se diga, devemos condenar o crime, fazer com que o criminoso pague ou responda pelos seus atos, mas isso não precisa ser em ambiente cruel ou degradante.
Há muito se exige uma reformulação legislativa para a adoção de medidas governamentais efetivas e orçamentárias para resolver o problema da falha estrutural no sistema.
Diante deste quadro, é preciso destacar que a pena não pode passar da pessoa do criminoso (art. 5º da CF/88) e isso quer dizer que ninguém pode ser punido no lugar (ou junto) do criminoso.
Destarte, neste diapasão, por não haver condições dignas no que tange ao tratamento dispensado à mulher presa, quando grávida ou mãe de filho menor de 12 anos (criança), recebe um tratamento diferenciado, é (ou deveria ser) para fim de que seu(s) filho(s) não sofra(m) injustamente as consequências da prisão da mãe.
Assim, a Lei 13257/16, inclusive no artigo 318 do CPP dispõe o seguinte: "Art. 318. Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for: IV - gestante; V - mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos;".
O STF, através da sua Segunda Turma, fixou os parâmetros (HC143641/SP, de relatoria do Ministro Ricardo Lewandowki) para que o Juiz substitua a prisão preventiva pela domiciliar, a qual deve ser concedida para todas as mulheres que sejam gestantes, as puérperas (que deram a luz há pouco tempo) e mães de crianças (menores de 12 anos) ou mãe de pessoas com deficiência, salvo se o crime for praticado contra seus descendentes (filhos e netos) ou se o crime for praticado com violência ou grave ameaça...
Ressalta-se que os Juízes, já nas audiências de custódia deverão adotar as diretrizes para a concessão da prisão domiciliar.
Há que se registrar, porém, que essa proteção efetiva dos malefícios da prisão da mãe não é absoluta, ou seja, em alguns casos a criança ou portador de necessidade especial ainda pode sofrer os efeitos deletérios do sistema penitenciário, direta ou indiretamente. Isso ocorre após a condenação definitiva, se imposto um regime fechado ou na hipótese de o crime ser praticado contra o infante, ou com violência ou grave ameaça.
Nessas hipóteses, há que se debater as alternativas ou o sistema elimina ou minimiza os efeitos negativos da condenação da mãe na vida dos filhos, ou amplia-se o benefício após a condenação (o que pode gerar uma sensação de impunidade) em benefício dos filhos. De qual quer sorte isso precisa ser avaliado caso a caso.
O fato é que o Superior Tribunal de Justiça no HC nº589442-SP decidiu que não cabe concessão de prisão domiciliar com fulcro no art. 38 do CPP quando se tratar de condenação definitiva , não obstante o Supremo Tribunal Federal tenha deixado essa questão em aberto (HC Coletivo 146.641/SP), admitindo a concessão da prisão domiciliar em qualquer caso desde que demonstrada a vulnerabilidade da criança e a imprescindibilidade de cuidados a ser prestada pelo sentenciado(a) à mesma, sem prejuízo da aplicação das cautelares alternativas previstas no art. 319 do CPP.
Fica o registro que o art. 117 da Lei de Execuções Penais admite que se concede a prisão domiciliar aos condenados em regime aberto- em determinadas condições excepcionais (condenado maior de 70 anos, acometido por doença grave, gestante, com filho menor ou deficiente), e que, portanto, não se autoriza a concessão do benefício nos regimes fechado e semiaberto.
A pandemia relativizou isso um pouco, através de uma resolução do CNJ, porém é necessário debater mais o assunto para saber se o benefício tem por finalidade a proteção da criança e ao deficiente, ou a contemplação do condenado, ou os dois. Melhor seria definir um caminho seguro para orientar os Juízes e Tribunais.
Voilà!