Opinião: Economia moral da violência na atual sociedade brasileira

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Seus Direitos na Justiça com Guaraci Campos Vianna
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Por Dr. Guaraci de Campos Vianna

Vivemos numa época pós-tudo. Pós-Marxista, pós-Kelsiana, pós-Freudiana. Brasil - 2021, ano 33 da Constituição de 1988. Mais de 80 anos de Código Penal (ao menos da parte especial), igual tanto de tempo do Código de Processo Penal. Não obstante a pré-compreensão interpretativa exija seja a interpretação o produto de uma época, tais dados históricos não podem ser desconsiderados.

Nos dias atuais a paisagem é complexa e fragmentada. Soberania hoje não é mais aquela de outrora. As fronteiras cederam à formação de grandes blocos políticos e econômicos, à intensificação dos fluxos de pessoas e mercadorias. A globalização é o símbolo do atual século. A pandemia fechou fronteiras, isolou pessoas, abalou a economia, matou gente, acirrou o debate político...

Entretanto, as desigualdades sociais e econômicas continuam, até aumentaram. O desequilíbrio das relações de poder político e poder econômico continuam. Não obstante a tecnologia de ponta, a genética e a obsessão pela eficiência, que inclusive tem levado a exigência cada vez maior de escolaridade, a competição pelo mercado de trabalho continua ocasionando a exclusão social dos que não são competitivos porque não podem ser.

Estado passou a ser o guardião do lucro e da competitividade. A própria lei caiu em desprestígio. Nem mesmo Estado Liberal (pré-modernidade) ou mesmo Estado Social (modernidade), conseguiram uma unanimidade no discurso a respeito das causas das desigualdades sociais. O Estado Neoliberal (pós-mordernidade) tem despertado para o tema, mas ainda não conseguiu chegar ao final do caminho, embora pensem muitos que a transdisciplinaridade seja o melhor caminho.

Todos, concordam, entretanto, com a existência de um fenômeno social causador de grandes males, gerador de muitos debates: Trata-se da violência. Herdeira de uma tradição autoritária e populista, elitizada e excludente, seletiva entre amigos e inimigos (e não entre certo e errado, justo ou injusto), mansa com os ricos e dura com os pobres, a sociedade brasileira, o Estado Brasileiro (que para muitos chegou a pós-modernidade sem ter conseguido ser liberal nem moderno) não conseguiu se livrar (e nem explicar) das causas e dos efeitos da violência.

Embora não se possa afirmar categoricamente que o homem é produto do meio, a recíproca não é verdadeira: O meio pode influenciar o homem. O Direito Penal, o sistema penal, sabemos todos, é um meio de contenção de massas. Mais do que um regulador do comportamento individual, o Direito é um regulador das massas descontentes. Esse descontentamento se dá, sem dúvida, em razão das dificuldades econômicas comparativas. Não é a fome e a miséria de todos, mas as dificuldades de muitos comparadas facilidade de poucos. Aí está a equação da economia moral da violência nos dias atuais. A maioria da sociedade brasileira, sem ter acesso ao mínimo para satisfazer suas necessidades básicas (alimentação, emprego, habitação e previdência, no sentido amplo) manifesta-se de forma isolada e desorganizada contra o sistema econômico desigual através da prática de crimes chamados de "delitos de sobrevivência". Isso equivale a dizer que estamos diante de uma "criminalidade aquisitiva", aquela que resulta em proveito econômico.

Num contexto mais amplo, podemos afirmar que há uma dupla tirania: a do dinheiro e a da informação.

A internacionalização do capital financeiro amplia-se, pois as empresas (Mega empresas) preocupam-se mais com o uso financeiro do dinheiro que obtém, dando lugar ao que Marx chamava de loucura especulativa. Por isso é lícito falar em tirania do dinheiro.

A informação transmitida a maioria da sociedade é manipuladora. Em lugar de esclarecer, confunde. No Brasil atual pode-se dizer que, na medida em que o que chega às pessoas (e empresas) é, já, o resultado de uma manipulação, tal afirmação se apresenta como ideologia.

Estamos diante de um novo "encantamento do mundo" no qual o discurso e a retórica são princípio e fim. A instrução do povo é mais através do convencimento (aqui o papel dos marqueteiros e publicitários da mídia tendenciosa). Há uma relação carnal entre a produção da notícia e a produção das coisas, manipulando-se fatos e, ideias e pessoas, em prol do bem comum (que passa a ser o bem de uma minoria).

A expansão do capitalismo, gera a concorrência, a competitividade e a ausência de compaixão. A figura se mais importante ter (despotismo do consumismo) do que ser.

As violências periféricas particulares são as únicas que tem merecido a atenção do Estado repressor e da política que, vez por outra, a pretexto de combater a violência acaba parecendo do mesmo mal, utilizando o mesmo método. No fundo tais manifestações de violência têm sua base na violência estrutural (central, original), movida e gerada pelos fatores tantas vezes já referido (exclusão social, luta desigual pelo dinheiro, etc) nunca eficientemente combatidos e enfrentados ou mesmo considerados no momento da repressão à violência.