Prestador de serviço ou serviçal?

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Sempre foi evidente pra mim, a posição no meu trabalho. Sirvo pessoas. Na cozinha, no salão, ou mesmo no meio da rua. Aprendi no Club Med que estar presente, ser solícito, se importar com as pessoas de verdade é fundamental pra servir. Aprendi com meus mestres durante minha vida profissional que quando você se doa para os outros, isso retorna. Servir é gratificante, energizante e satisfaz. Aprendi com meus mestres da hotelaria a importância da hospitalidade e seu estudo, relativamente novo, e que sem dúvidas enobrece um sem número de posições profissionais. A hospitalidade mora dentro de nós, e deve ser uma porta aberta pro outro. 

Mas ainda, de um jeito quase libidinoso, o servir a outrem está entrelaçado com a sensação de ser um serviçal - isso da forma mais pejorativa possível. Talvez, isso explique o jovem de classe ter pavor de servir, com vergonha. 

Em uma mesa grande com amigos num restaurante no jockey; choquei quando disse categoricamente: "somos, nós brasileiros, clientes muito ruins". Sim, eu acho que somos clientes ruins- muito ruins aliás.  

Provei.  

Achamos que o garçom está demorando porque está atendendo outra mesa, como se fosse dois, e pudesse estar lá e aqui. Achamos que o garçom não nos entende quando mudamos o pedido quatro vezes antes de decretar nosso pedido final. Por mais que chamemos, o garçom não vem - ele está pegando a bebida do nosso companheiro de mesa. Mas quando vamos ao velho continente, somos tratados com grosseria e achamos o lugar mais charmoso do mundo. O garçom nos atende no tempo dele, e esperamos. Entendemos quando ele está dando atenção a outra mesa, mas aqui, não.  

E nos Estados Unidos? O número de mesas pra cada garçom é muito maior. Por que eles são melhores? Não é. Nós não somos tolerantes. Eles erram como os nossos. Ainda assim, culturalmente, mensuramos a gorjeta de acordo com uma convenção, lá variando entre 10% e 15%. Se for bom, damos mais. Aqui, por ser quase sugestionado os 10% - quase obrigatório - tiramos deles, e não "deixamos de dar". Uma lógica reversa e cruel. 

Talvez, por termos sidos colonizados, externamos nossa "supremacia" nas relações de prestação de serviço, especialmente em restaurantes mais caros. Quem nos serve é menor, menos alguma coisa. Quase numa relação de sucessarania e vassalagem em looping. 

Por que? 

"Mas não sou assim", muitos falaram. 

Desafiei na mesa quantos aqui são capazes de me descrever quem nos está atendendo por toda a noite? 

Ninguém foi capaz. 

Já passei por isso dezena de vezes. Pessoas conhecidas, que consideram que são no mesmo "nível", atendidas por mim em algum momento, sequer levantaram seu olhos, e somente depois, percebem estar sendo atendidas por mim. E ainda, como se não fosse normal, se sentam encabuladas por eu estar atendendo, como se fosse um ultraje, ou ainda, como se eu fosse maior que isso. 

As maiores pessoas da humanidade serviram. Se doaram. Se dedicaram a outrem. Por que não posso levar seu café? 

Percebi como somos ingratos com os que nos servem quando, servindo clientes poloneses e americanos, eles demonstram uma gratidão ímpar por pequenos gestos que estamos acostumados a reproduzir. Como se um esforço descomunal fosse empregado naquilo. E está, mas não vemos, ou pior, não sentimos. 

Curiosamente isso não acontece no boteco. Lá, o espaço legitimamente democrático, permite que todos sejamos iguais perante o chope. Seu Manoel é gente, parceiro. O bigode, garçom das antigas, é amigo. O mesmo sujeito, lá é igual. 

Será nosso nível de exigência alto demais?  

E você? Como se sente? Comente aqui o que acha e me convença que temos jeito como clientes! 

 
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